"Em
cada estação havia um chefe....
Ele usava além da farda do ofício, e
para despacho do comboio, duas bandeirolas e duas lanternas, uma vermelha e
outra verde, que muito intrigavam as crianças. Mas o seu adorno principal era
uma enorme campainha de cabo, uma campainha do tamanho de um sino pequeno, que
empregava com ares de comando".
Quem diariamente, com olhar distraído,
faz o percurso entre Cais do Sodré e Cascais, dificilmente imaginará o
pitoresco e emoção de uma viagem, neste trajecto, feita pelos nossos avós, no
século passado.
"A
viagem era morosa, poeirenta, fatigante, sacudida de solavancos. Vestia-se às
vezes um guarda-pó para ir a Cascais. Uma poeira grossa, encarvoada, entrava pelas
janelas do comboio e metia-se sem pedir licença, nos olhos de cada um mas não
alterava a alegria do passeio, nem a beleza da paisagem marítima, nem o encanto
da serra de Sintra a coroar o horizonte terrestre".
A Linha, que então era apelidada de
ramal, começou por ter o seu início em Pedrouços e não no Cais do Sodré, como
viria a acontecer anos mais tarde.
(Pedrouços)
(Cais do Sodré)
Vindo do lado da Baixa Pombalina, o
alfacinha tomava um dos vapores da empresa Lisbonense e rumava a
Pedrouços, para aí fazer transbordo e seguir viagem em direcção a Cascais. A
viagem de omnibus ou de "americano" além de morosa não era muito
agradável, pois a estrada municipal que ligava Lisboa aos arredores, para além
do Aterro (Santos), era poeirenta e esburacada, sendo o caneiro de Alcântara,
mais um obstáculo para quem o quisesse fazer por via terrestre.
(Estação Vapores Lisbonense)
Iniciada a viagem, de costas voltadas
para a Torre de Belém e para o Mosteiro dos Jerónimos, o comboio atravessava a
Ribeira de Algés e parava nesta estação, que estrategicamente se situava na
confluência da estrada de Carnaxide com a estrada Real.
(Algés)
Algés era então uma pequena aldeia, dos
arredores de Lisboa cujo núcleo de casario se situava na sua parte alta.
Seguia então o comboio, em linha recta
para o Dafundo, que tinha apenas um apeadeiro, que se situava junto ao aquário
Vasco da Gama.
Cruz Quebrada, a próxima estação, está
situada na margem direita da Ribeira do Jamor, tal como hoje, junto à pequena
praia de banhos.
(Cruz Quebrada)
A linha segue depois junto ao sopé das
colinas da Boa Viagem e da Gibalta, em terrenos conquistados ao rio. Os mais
velhos quando aqui passam, ainda recordam o desabamento de terras, que em
Agosto de 1958, provocou a morte a muitos passageiros que seguiam nessa altura
no comboio.
Caxias, a próxima paragem, fica virada
para o forte de S. Bruno. Aqui terminava a via dupla e a linha afasta-se um
pouco do rio.
(Caxias)
Dirigia-se depois a Paço d'Arcos, com a
sua elegante praia de banhos. Passava por enormes pedreiras em Santo Amaro , que ainda
não tinha estação, e, atravessava a Ribeira da Laje, pela maior ponte da linha,
alcançando Oeiras.
(Paço d' Arcos)
(Oeiras)
Carcavelos está à vista, e por entre
pinheiros e vinhas (que davam o famoso Carcavelos) a linha continua
dirigindo-se à Parede, cuja praia era, e ainda é, considerada como uma bênção
da natureza para quem tem problemas de ossos, atravessando-a pelo meio da
povoação. Passa-se a Baforeira e a linha flecte um pouco para o interior.
Atinge-se os Estoris.
(Carcavelos)
(Parede)
No
traçado original, apenas S. João do Estoril tinha estação de comboio. Só
posteriormente foram construídas, além da do Estoril propriamente dita, a de S.
Pedro e a do Monte.
S.
Pedro do Estoril, que ainda nos anos vinte se chamava de Cai-Água , teve a sua
estação de caminho de ferro, graças aos esforços de Nunes dos Santos,
proprietário dos antigos Armazéns do Chiado, que ali tinha comprado uns
terrenos e que ofereceu o espaço e o dinheiro necessários para a construção de
um apeadeiro, certamente tendo em conta, a valorização dos terrenos de que era
proprietário.
(Estoril)
(Monte Estoril)
No
troço entre os Estoris e Cascais, a linha volta a aproximar-se do Oceano, tendo
também por companhia, o verde dos pinheiros do Estoril e o escarpado das terras
do Monte.
Cascais,
vila piscatória, com os seus palacetes é o fim da viagem e da Linha.
(Cascais)
Inaugurada
a 30 de Setembro de l889 e electrificada em 1926, a exploração de
linha, começou com 18 carruagens de 1ª classe, igual número de 2ª classe, e, 30
de 3ª classe, custando a viagem entre os dois extremos, 480 réis 240 e 150
réis, respectivamente.
No
primeiro ano, foram vendidos 615 592 bilhetes, sendo 14339 de 1ª classe, 285
564 de 2ª e, 315 689 de 3ª classe.
No
período compreendido entre 1918 e 1976, a linha foi explorada pela Sociedade
Estoril.
O
traçado da linha, durante a sua centenária existência foi apenas modificado em
pequenos troços, com vista a encurtar distâncias a suprimir passagens de nível
ou ainda, aproxima-la do Tejo e do Atlântico.
Imagens de Postais comerciais e de postais editados pela CP por
ocasião do centenário de Linha de Cascais, da colecção particular do autor.
Parágrafos em itálico da autoria de Branca Gota Colaço e Maria
Archer (in Memórias da Linha de Cascais )
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