O
realizador italiano Ettore Scola morreu esta terça-feira, aos 84 anos. O
realizador de Tão Amigos Que Nós Éramos (1974) e de Feios,
Porcos e Maus(1976) e Um Dia Inesquecível (1977) estava internado
desde domingo em Roma, revelou a agência italiana ANSA. Era considerado o
último dos grandes realizadores da "comédia italiana", categoria que
é sempre limitativa, que até foi uma denominação criada com algum sentido
pejorativo, e que na verdade diz pouco do que fizeram todos os que a cultivaram
ou que por lá passaram - Monicelli, Risi, Comencini, Scola...
Em
2011, tinha posto fim à sua carreira cinematográfica mas em
2013 apresentou no Festival de Veneza Che strano chiamarsi Federico/Que
Estranho Chamar-se Federico, filme-homenagem ao
seu amigo Federico Fellini com imagens de arquivo. Numa
entrevista ao jornal Il Tempo, em 2011, afirmava que dizia adeus ao cinema
"sem se arrepender de nada" depois de uma carreira de mais de 50 anos
e mais de 40 filmes realizados. Explicou na altura já não se sentir
sincronizado com a indústria cinematográfica.
"A
minha experiência no mundo da realização já não é o que costumava ser:
descontraída e feliz. Hoje há lógicas de produção e distribuição com as quais
não me identifico", contou nessa entrevista o realizador, acrescentando
que no cinema é fundamental ter-se liberdade de escolha. "Estava a começar
a sentir-me obrigado a respeitar regras que não me permitiam sentir
livre",afirmou
nessa entrevista de 2011.
Estava
desiludido, acreditava que já não havia lugar para a criatividade como
antigamente. "A crise económica ainda veio agravar mais a situação. Tendo
em conta a minha idade, sei que fiz o que devia. Não me arrependo de nada.
Trabalhei sempre com uma grande liberdade. Numa certa altura, chega o momento
em que o melhor a fazer é retirar-me", acrescentou.
Já
antes, em 2009, Scola dizia estar num momento da vida em que o cinema
contemporâneo já pouco lhe dizia. “Prefiro gozar da minha velhice”, afirmou ao La
Repubblica, garantindo estar a viver “um momento belíssimo”.
Ettore
Scola nasceu a 10 de Maio de 1931, em Trevico, Itália. Depois da Segunda Guerra
Mundial foi viver para Roma, onde estudou Direito. Contudo, o gosto pela
escrita criativa e pelo cinema foi mais forte e, em 1953, iniciou a sua
carreira na indústria cinematográfica como argumentista, depois de ter
trabalhado como humorista em algumas revistas - meio onde conheceria Fellini, e
é sobre esses anos que fala Que Estranho Chamar-se Federico. Durante uma
década, contribuiu com material para inúmeros filmes de Dino Risi e de outros
realizadores, tendo colaborado frequentemente com Ruggero Maccari,
destacando-se desta parceria a comédia Il Magnifico Cornuto (1964),
com Claudia Cardinale. Em 1964, estreou-se como realizador com Se
permettete parliamo di donne.
O
sucesso internacional chegou em 1974 com Tão Amigos Que Nós Éramos,
retrato da sociedade italiana no pós-guerra, dedicado ao seu amigo, actor e
realizador Vittorio de Sica, com Nino Manfredi, Vittorio Gassman e Stefania
Sandrelli. (Valerá a pena compará-lo com outro balanço geracional, o Amici
Miei, de Monicelli, realizado um ano depois: o romantismo de Scola, sempre em
tons fúnebres, é a outra face da moeda da vitalidade guerrilheira de Monicelli).
Dois anos depois, venceu o prémio de Melhor Realizador no Festival de Cannes,
com Feios, Porcos e Maus, talvez o seu título mais conhecido.
Mas o seu grande classico é Um dia
Inesquecível (1977), protagonizado por Sophia Loren e Marcello
Mastroianni, que interpretam dois vizinhos que se conhecem em 1938 durante uma
visita de Hitler a Itália. Eis um exemplo de como a "comédia à
italiana" é coisa redutora: sublime melodrama, história de amor impossível
entre uma dona de casa e um homossexual num apartamento fechado - filmado numa
das "relíquias" da arquitecura fascista de Roma - Um dia
Inesquecível foi nomeado para dois Óscares: Melhor Filme Estrangeiro e
Melhor Actor (Mastroianni). A melancolia, o amor como coisa funesta, são
sentimentos de Passione d'Amore (1981), dois anos antes de um dos
sucessos da sua carreira, O Baile. (Jornal Público – 20.Jan.2016)
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